Um texto esquecido por aí

16 de novembro de 2009 at 18:02 (Exorcismos)

Ao Wesley, que me lembrou que eu tinha um blog.

Escrevi num momento de epifania, nem lembro se está bom (prefiro não ler meus textos):

“Quando a gente olha pro mundo e não vê nada, quando não tem nenhuma possibilidade, quando é impossível realizar qualquer coisa, não é o mundo que está subitamente errado e sem saída, é a gente que não consegue olhar pro mundo e ver possibilidades. Quase sempre não são as coisas que são impossíveis de serem feitas, somos nós que escolhemos querer as coisas impossíveis e nós que não conseguimos ver maneiras de fazê-as. Não, essa não é a ilusão liberal nem a ilusão do senso comum que acreditam que basta ter vontade para se conseguir tudo no mundo. Não, não basta vontade. O mundo é sim todo cheio de contradições, de acasos desgraçados e de conflitos, mas não é o mundo determinado e estático dos que querem justificar suas fraquezas e as dos outros. É mais fácil colocar a culpa no mundo, né? A gente se sente melhor consigo mesmo. O mundo é louco e a vida uma merda, mas estão sempre se movendo, sempre. Em geral, não é preciso sequer que o mundo apresente de fato suas armas, ninguém nem tenta ir em frente. Tudo parece muito grandioso, uma obra muito bem pensada e sólida, quem seria maluco de tentar inventar algo? Em geral, as contradições reais do mundo nem sequer precisam apresentar-se pessoalmente ao sujeito, ele lida sempre com seus mensageiros. O mundo já se apresenta como uma enorme obra de concreto e aço, feita para ser indestrutível, e a gente vê esse gigante – em movimento, a gente sabe no fundo que ele se move – e cristaliza essa imagem gigantesca na nossa cabeça, ela fica lá quase para sempre. Muito antes de qualquer tentativa tentar colocar-se em prática, está lá o mundo paralisado, como um muro barrando tudo. As pessoas vêem sim as contradições do mundo, todos sabem muito bem que tem muita coisa errada nessa história toda, não precisam de ninguém para avisar isso pra elas, nem pra defender o socialismo. Todos vêem esse mundo todo errado e ele é uma mega construção sempre parada. Ninguém enxerga possibilidades numa imagem cristalizada. Todos os becos do mundo parecem sem saída. Dá-se um jeito e vai-se levando a vida, mas possibilidades mesmo, são poucas as vezes que alguém cria. Não é o mundo de fato que paralisa alguém, é a imagem do mundo para esse alguém. As tentativas nem sequer são pensadas, nem sequer se imagina que seja possível pensá-las. O mundo é um produto pronto e acabado, não fui em que fiz nem você, não sabemos como funciona, quem somos nós para mexer nessa coisa? O mundo fetichizado não precisa mostrar suas garras, nós as vemos muito antes. Não se mexe no que já tá pronto, ainda mais quando não foi a gente que fez. Todo mundo sabe disso. Aquilo que já está cristalizado já morreu em possibilidades e movimentos. O produto, esse mesmo, a mercadoria, chega sempre pronto, é de uso imediato, pré-determinado. Nunca se sabe de onde veio, quem fez, como se faz. Ou talvez se saiba sim, mas não importa, depois de pronto, tudo fica diferente, irreconhecível. Aprendemos a ver tudo o que temos nas mãos como objetos únicos, que se encerram em si sós, que nunca vão além do que servem para ser. Tem crianças que ainda não aprenderam as utilidades das coisas, as suas razões de ser e objetivos, nas mãos dessas criaturas tudo vira de cabeça para baixo e se transforma em algo tão absolutamente inesperado e sem sentido que nem entendemos o que passaram a ser exatamente. É a capacidade de romper o fetiche, ou de não ter o fetiche, de ver possibilidades que sempre estiveram lá, movimentos que surgem o tempo todo. Porque no limite ainda há possibilidade, ainda que seja a morte.”

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